O momento da cultura do café no Brasil é extremamente delicado. Desde o início da safra 2021/2022, anunciamos que as previsões de algumas empresas – que apontavam um volume produzido acima dos 60 milhões de sacas de 60 kg – eram errôneas. Os números foram os mais diversos, indo desde 48 milhões de sacas até quase 70 milhões de sacas estimadas. Já sabemos que a quebra estará acima do que alguns pensaram.
Concordamos com os dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), principalmente quando houve o ajuste para 53.428 milhões de sacas. Segundo a Companhia, essa produção é 15,3% ou 9,65 milhões inferior às 63,08 milhões de sacas colhidas em 2020, último ano de bienalidade positiva. Comparativamente à safra 2021, o resultado é 12% superior. Do volume total, a previsão é de uma produção que chegue a 35.711,9 milhões de sacas de café arábica beneficiado (acréscimo de 13,6% em comparação à safra anterior, 23,6% inferior ao último ano de alta performance) e de 17.716 de conilon beneficiado (aumento de 8,7% em relação à safra anterior, puxado pelo incremento de produtividade que tem sido recorrente a cada ano).
A Conab informou, em maio, que a produtividade média nacional prevista para a atual safra estaria na casa de 29 scs/ha, valor 10% acima da obtida na safra 2021. Em relação à safra 2020, ano de alta bienalidade, quando foram colhidas 33,5 sacas, observa-se uma redução de 13,4%.
Ao analisar os dados, notamos que o déficit hídrico provocado pelo fenômeno La Niña foi extremamente danoso no processo de “pega” e enchimento dos grãos para essa safra, fazendo com que tenhamos menos frutos, cujas rosetas não geram volume suficiente para alcançar o volume publicado pela Conab. Esta é a constatação que estamos vendo com uma colheita de cerca de 96% do café produzido. Concluímos, portanto, que a quebra desta safra é muito superior ao que todos nós estimamos.
Além da seca prolongada, tivemos a infelicidade de enfrentar uma geada em julho de 2021, que prejudicou cafezais do Sul de Minas e Cerrado Mineiro, principalmente. No entanto, esses estragos foram menores do que muitos apontaram nos primeiros dias após o evento climático. Tivesse sido uma geada negra, como alguns disseram, não teríamos o volume que colhemos até aqui.
Atualmente, a análise deve estar com o foco nos estoques. O café colhido na safra que ora se encerra é, sem dúvida, insuficiente para abastecer o mercado. Para esse abastecimento, necessário se faz usarmos os estoques de passagem dos anos anteriores. Considerando-se que o consumo interno e externo, também contrariando a todas as expectativas, está crescendo de maneira lenta e gradual, teremos em 31 de março de 2023 o menor estoque de passagem já verificado no país.
Portanto, pensando que os cafés a serem entregues neste momento foram comercializados antes que acontecessem os eventos climáticos, teremos que lutar para que os produtores honrem seus contratos, mantendo assim a credibilidade do Brasil no mercado exterior.
Outro ponto a se discutir está no fato de que a safra 2022/2023 é de bienalidade negativa. Portanto, temos a convicção que não alcançaremos um resgate de estoques no próximo ano. Porém, é muito cedo para falar em porcentagem de quebra, como já ouvimos alguns órgãos privados expondo. As chuvas até aqui não geraram reserva de umidade no solo, deixando clara nossa dependência do volume de chuvas no mês de setembro/outubro para que alcancemos resultados positivos na colheita do próximo ano.
Essa influência climática adversa não aconteceu somente na produção de café brasileira, mas também em outros países produtores, que inclusive, sofrem com a incidência de pragas e doenças.
O CNC, historicamente, não orienta produtores acerca de suas decisões comerciais ou de como devem agir no mercado. Como braço operacional do sistema OCB para o café, nossa função é estudar os dados de estoque, promover ações de conscientização para uma produção de qualidade e sustentável, em todos os seus aspectos, organizar as demandas do segmento cooperativo para a construção de políticas, ações e projetos, com abrangência nacional, beneficiando os mais de 330 mil produtores brasileiros. E, neste momento, o que podemos sugerir é que o cafeicultor invista em planejamento.
Em última análise vale lembrar que o Brasil conta com o Fundo de Defesa da Economia Cafeeira, o Funcafé. Esse é um dos importantes papéis do Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC), que gesta o Fundo, sendo o banco do produtor uma forma de organizar e liberar os recursos através de nossas cooperativas de crédito e de agentes repassadores para, em suas linhas diversas, dar a sustentação necessária aos nossos cafeicultores. O volume liberado é substancial, pois o Funcafé dispõe de R$6,058 bilhões.
As conclusões sobre o nosso artigo competem às nossas cooperativas, associações e produtores, sendo que o único objetivo do mesmo é prestar informações que poderão ser úteis num processo de decisão.
Por Silas Brasileiro, Presidente do Conselho Nacional do Café (CNC)
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